sábado, 19 de junho de 2010

A morte nem sempre é o fim.



Morre, aos 87 anos, o escritor português José Saramago, Nobel de Literatura. A qualidade e o estilo do escritor português arrebanhou fãs em todo mundo. Vai deixar muitas saudades e, seguramente, será lembrado ao longo da história da literatura.
Compartilho uma entrevista concedida à Nova Escola em 2003. Ao deleite!!!

As ideias de Saramago põem em questão o papel da escola no desenvolvimento da criatividade. Ele provoca os educadores ao afirmar que para navegar sem regras é preciso ser um bom condutor, e este não se faz sem aprendê-las. Saramago não espera - e portanto não cobra - da escola a subversão da língua, e sim seu domínio.

O estilo de sua escrita muitas vezes subverte a estrutura da língua portuguesa, atitude raramente valorizada pelos professores quando manifestada pelos alunos. O senhor acredita que há pouca flexibilidade na forma de lecionar o português?
José Saramago A escola deveria ensinar a ouvir. Cabe a ela ensinar o aluno a escrever corretamente e também explicar por que as regras são assim, e não de outra maneira. Mas a escola não será o lugar onde se subverte e revoluciona a estrutura da língua. Essa tarefa pertence aos escritores, se estes consideram que têm motivos para o fazer.

A maneira como a língua é ensinada não influi no surgimento de novos estilos?
Saramago Os estilos saem do ovo da sua própria necessidade. Ensine-se a pensar claro e a escritura será clara. E, já agora, gostaria que houvesse uma luta implacável contra o erro de ortografia. A língua é uma ferramenta de comunicação de todas a mais perfeita , e as ferramentas (pergunte-se a um operário) têm de estar limpas e em condições de trabalhar eficazmente.

É difícil criar uma nova maneira de redigir quando existe toda uma norma culta que impõe regras a quem usa a língua?
Saramago Como eu disse, a escola não é o lugar em que se subverte a estrutura da língua porque ela não tem preparação própria suficiente para se arriscar nessa aventura. As regras são como os sinais de trânsito numa estrada. Estão ali para orientar e dar segurança ao condutor. Claro que é possível viajar por uma rodovia onde não haja sinais de trânsito, mas para isso é indispensável ser um bom condutor. Aí está a diferença.

Nas suas memórias de estudante, o que mais influenciou a sua carreira?
Saramago Nada me influenciou verdadeiramente, nem ninguém. Salvo a seleta escolar (a coletânea de textos literários que havia à disposição dos alunos), que para mim fez as vezes da biblioteca que não existia na minha casa. Depois descobri o caminho das bibliotecas públicas, e foi aí, sem que eu pudesse sequer imaginá-lo, que o escritor começou a nascer.

No início de sua carreira, a crítica literária muitas vezes foi negativa ao analisar suas obras, mas isso não o impediu de continuar...
Saramago Uma ou outra crítica reticente ou negativa que algum dia me tenha sido feita não mereceria que lhe pusessem ao pescoço um cartaz tão terrível. Salvo, evidentemente, se se trata de opiniões que não chegaram ao meu conhecimento. De qualquer modo, nem a crítica mais destrutiva me faria desviar do meu caminho.

O prazer que crianças e adolescentes sentem ao escrever corre o risco de ser minado por críticas negativas recebidas durante as aulas. Como seria a maneira mais adequada de analisar as redações dos alunos?
Saramago Penso que a análise deveria ser não de julgamento, mas orientadora. O mais fácil de tudo é dizer "isto está bem" ou "isto está mal". Os problemas começam quando se quer explicar o porquê e se chega à conclusão de que afinal o que determinou o juízo, positivo ou negativo, foi simplesmente o gosto pessoal e intransmissível do mestre.

De que maneira um professor de Língua Portuguesa incentiva e ajuda seus alunos a compor boas redações?
Saramago Pondo-os para ler em voz alta. Não há maneira melhor de ganhar consciência do que se lê, e, portanto, do que se poderá vir a escrever. O que os signos impressos mostram é o desenho da palavra "embalsamada". Só a leitura em voz alta a "ressuscita" completamente. Os docentes dirão que não há tempo para isso, mas depois não terão outro remédio que corrigir erros que poderiam ter sido evitados. Se é que verdadeiramente os corrigem. Porque corrigir não é traçar um risco vermelho debaixo da palavra. Corrigir é reconstruir a palavra na mente do aluno.

Como se dá o processo de criação de seus livros?
Saramago É quase impossível lhe dar essa resposta. Pode-se recordar como nasceu a idéia de um romance, pode-se reconstituir mais ou menos o que no seu percurso foi consciente, mas, tal como sucede com os icebergs, o mais importante não se vê. O que sustenta o visível está por baixo. Sabe-se aonde se quer chegar, mas, exceto alguns pontos de passagem, não conhecemos o itinerário. Como escreveu Antonio Machado, o grande poeta espanhol, é o andar que faz o caminho.

O senhor não planeja a obra que está iniciando?
Saramago No meu caso particular, o romance cresce como cresce uma árvore. Suponha que a árvore conhece a altura que terá, o aspecto geral da espécie a que pertence, mas sabe (imagino que sabe) que não será igual à sua vizinha. Os ramos podem nascer-lhe mais acima ou mais abaixo, apontar para um lado ou para outro. Se tem um plano de crescimento, é possível dizer que nesse plano há tanto de liberdade como de necessidade. Para mim, seria impensável estabelecer um plano rígido para o livro, com cada coisa no seu lugar e um lugar para cada coisa. As associações de idéias, processo mental que não controlamos, podem levar-nos por caminhos que não havíamos previsto. Também na escrita a liberdade vai de braço dado com a necessidade.

Depois de finalizar um romance, o senhor costuma modificar o que inicialmente escreveu, aumentar ou diminuir capítulos, inserir novos trechos?
Saramago Volto à comparação com a árvore. Podemos conceber uma árvore capaz de corrigir-se a si mesma? Não ignoro que há autores que trabalham longamente sobre o texto, que desenvolvem, encurtam, intercalam. Não é o meu caso. Avanço devagar, com a preocupação de não deixar pontas soltas, e isso permite-me manter sempre "esticado" o fio narrativo. De todo o modo, não devemos esquecer que o texto é inseparável do momento em que é escrito. Há muito de aleatório no que se escreve.

O que significa escrever para o senhor?
Saramago É ir descobrindo que tínhamos na cabeça mais coisas do que havíamos suposto antes.

Como o senhor escolhe os temas de seus romances?
Saramago Não "escolho" os assuntos dos meus romances. São eles que se apresentam de súbito, e às vezes nas situações mais prosaicas. O autor é "escolhido" pelo assunto, não o contrário. Quando parar de redigir, isso significará que os temas deixaram de considerar-me capaz de lidar com eles. Quanto à circunstância de que eles sejam o que são e não outros, isso explicar-se-á, talvez, por determinados estímulos exteriores encontrarem eco na minha mente mais facilmente que outros.

Há temas que o escolhem, então, com mais freqüência?
Saramago Há que levar em conta a natureza pessoal do autor. Não tenho nada contra a alegria, mas sou e sempre fui melancólico. E tenho a veleidade de pensar que o ser humano cresce mais com a tristeza que com a alegria. Começando pelas crianças. Se uma criança está triste, melancólica, pensativa, deixemo-la em paz porque está a crescer.( Fonte: Nova Escola)

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A escola emburrece???


Certo dia ouvi isso e, na ocasião, fui firme em dizer que não. Sempre acreditei que a escola é lugar de (trans)formação, um polo irradiador de informações e cultura. De fato, em alguns lugares, a escola assume esse papel e o cumpre. Entretanto, há controvérsias em relação a qualidade do que é difundido.Lembro-me de uma escola rural em que trabalhei e as expectativas eram grandes em relação aos acontecimentos sociais, pois naquela localidade a escola ia muito além do conhecimento formal.Mas, retomando a questão " a escola emburrece?", hoje, penso que em certa medida sim, nos emburrece. A realidade numa escola é bem mais dinâmica do que pode supor aqueles que nos dirigem. Não é de todo condenável os planos e programas em todos os níveis para o progresso do sistema e da qualidade educacional, mas nem sempre eles permitem um real avanço na aprendizagem. Parabenizo a todos aqueles que conseguem fazer a diferença em meio as dificuldades do cotiano escolar, pois, seguramente, eles abdicaram de muitas horas de lazer em prol do trabalho pedagógico. As políticas públicas, em que se pese os avanços, ainda são muito insipientes para transformar a realidade que temos; professores e alunos desmotivados (sou adepta de Roberto Freire " Sem tesão não há solução"). Acho que a cada dia perdemos um pouco mais desse furor inicial e parte disso deve-se aos equívocos das políticas públicas para a educação. Temos 1001 motivos para estarmos desmotivados e doentes, entretanto, devemos nos apegar ao que importa de fato...o sorriso de agradecimento daquele que aprendeu conosco, é aí que devemos renovar a nossa esperança, pois, apesar de estar como está a educação ainda é o maior, senão o único, instrumento de transformação social.
Assim, é importante que façamos a nossa parte da melhor maneira possível. Até mais.