quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Esquecer, Rubem Alves

Era uma menina de nove anos. Caminhava segura à minha frente. O diretor da Escola da Ponte lhe pedira que mostrasse e explicasse a escola. Fiquei ofendido. Esperava que ele, diretor, me respeitasse como visitante estrangeiro e me mostrasse e explicasse a sua escola. ´Chegando à porta da escola ela parou, deu meia volta, olhou-me nos olhos e me disse: "Para o senhor entender a nossa escola o senhor terá de se esquecer de tudo o que o senhor sabe sobre escolas...". Decididamente ela se dirigia a mim de uma forma petulante. Então eu, um educador velho que tenho a estar a pensar sobre as escolas desde menino, com a cabeça cheia de livros, teorias e experiências, deveria esquecer-me do que sabia? A menina estava certa. Meu espanto era sinal de que ela acabara de me aplicar um "koan" - um artifício pedagógico dos mestres Zen. Para aprender coisas novas é preciso esquecer as velhas. O que sabemos torna-se hábito de ver e de pensar que nos faz ver o novo através dos óculos do velho - e o transforma no que sempre vimos, e tudo continua do jeito como sempre foi. Roland Barthes, ao final de sua famosa Aula, disse que naquele momento de sua vida se dedicava a desaprender o que havia aprendido para aprender o que não havia aprendido. Não havia aprendido porque a memória do sabido havia bloqueado a aprendizagem. "Empreendo, pois, o deixar-me levar pela força de toda a vida viva: o esquecimento. Vem agora a idade de desaprender, de deixar trabalhar o remanejamento imprevisível que o esquecimento impõe à sedimentação dos saberes, das culturas, das crenças que atravessamos..." Para entendê-lo, é preciso que você ponha seus saberes entre parêntesis, que veja o mundo pela primeira vez, como sugeriu Alberto Caeiro. Se não fizer isso, a leitura será inútil. Você continuará a ver o mundo velho que já conhecia. Para um pássaro engaiolado o mundo tem barras... A psicanálise é uma pedagogia do esquecimento. Freud percebeu que as pessoas, por causa da memória, ficam prisioneiras do passado. Os neuróticos repetem o passado. Sua memória é a sua teoria do futuro. O presente e o futuro são como minha memória diz. Por isso são incapazes de ver o novo. "Uma cobra que não pode livrar-se de sua casca perece. O mesmo acontece com aqueles espíritos que são impedidos de mudar suas opiniões; cessam de ser espírito." (Nietzsche)Os mestres Zen eram mestres de um tipo estranho: não tinham saber algum para ensinar aos seus discípulos. Sua atividade pedagógica se resumia em passar rasteiras nos saberes que seus discípulos traziam consigo. ( Se há "construtivismo", os mestres Zen eram "desconstrutivistas"... ). Eles perceberam que os saberes que pensamos são semelhantes à "catarata": uma nuvem que obscurece os olhos. Para operar a catarata dos seus discípulos, se valiam dos "koans". Um "koan" é uma afirmação que "desconstrói" o nosso saber como um terremoto derruba uma casa. Quando a nuvem de pretenso saber é retirada, o discípulo vê o que nunca havia visto. Experimenta o "satori", a iluminação. Quando a menina me disse que eu tinha de me esquecer do que sabia sobre escolas ela me aplicou um "koan". E passei a ver as escolas como nunca havia visto. Esse é o evento que marca o nascimento de um educador: olhos novos para ver o que nunca se viu.

Encontro do dia 28/08

O assunto do nosso encontro foi "mudança lingüística", fascículo 6, temas dessa natureza sempre geram grandes debates e, as vezes, embates, não foi o nosso caso. Tenho tido gratas surpresas nesses encontros, talvez pelo fato de sermos todos professores de língua portuguesa, o que não acontece na maioria das turmas do módulo2. Nossas discussões são sempre muito ricas e quase sempre recheadas de exemplos do dia- a- dia em sala de aula, o que contribui de modo significativo no processo de ensino/aprendizagem dos conteúdos abordados. O texto que ofereci aos cursistas para iniciarmos nossos trabalhos foi " Esquecer" (Rubem Alves) e encaixou-se perfeitamente ao tema do dia, pois, em se tratando de mudanças e variações lingüística temos que esquecer muito do que internalizamos. O passo seguinte foi socializarmos as nossas impressões sobre o filme Desmundo, falamos sobre a preciosidade e riqueza da pesquisa para a produção do filme, das interpretações grandiosas, da mulher no período da colonização, das personagens que aqui habitavam, entre outras, aliás foram muitos os comentários. Cada um com o seu olhar, olhares múltiplos, falar sobre nossas raízes culturais, nossa formação de maneira tão desnuda, para mim foi surpreendente o retorno dos cursistas todos assistiram ao filme e todos perceberam os fenômenos linguísticos ocorridos em nossa língua, alguns, inclusive registraram as palavras que ainda sobrevivem em nosso idioma nos dias atuais. Confesso que a nossa discussão fez com que eu enxergasse outros elementos que passaram em brancas nuvens quando assisti ao filme, me faltou o olhar de pesquisador, olhar tão apurado que eu percebi hoje nos rostos e nas falas dos cursistas. Nós somos fruto dessa miscelânea de línguas, raças e credos diversos, é importante termos conhecimento desse registro histórico para que as mudanças façam sentido em nossas vidas e em nossas práticas pedagógicas. A língua é viva , portanto, mutável.
Diante da relevância da lingüística histórica todos nós faremos uma produção textual acerca das nossas impressões em relação ao filme, principalmente dos fenômenos lingüísticos detectados, pelos comentários de hoje, posso crer que sairão excelentes produções.
Considero-me uma privilegiada por ter a oportunidade de aprender tanto com essa turma, hoje foi um desses dias de muito aprendizado, concordo com a Sandra o filme é belíssimo e ressalto que o meu horizonte de experiências é que era demasiado estreito para apreciá-lo, entretanto terei uma nova experiência, agora com o olhar apurado que deve ter um pesquisador.
Até semana que vem.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Encontro do dia 14/08

Dia de encontro é sempre muito bom, pois fico anciosa para encontrar os cursistas e sentir as boas vibrações de uma troca de conhecimentos. Hoje fiquei um pouco apreensiva porque o quórum estava baixissímo, mas assim mesmo seguimos o nosso ritual e trabalhamos o fascículo 7, com os seus pressupostos e subtendidos, compartilhamos algumas possibilidades de trabalhos com os alunos, sobretudo com as tirinhas. Desenvolver habilidades de leitura fazendo com que o aluno possa ir além da decodificação é um dos desafios do professor e para tanto é indiscutível que, além da motivação, o professor deve ter um embasamento teórico. Ao longo dos encontros vamos amadurecer e fortalecer nossos conhecimentos acerca das teorias sobre leitura, um bom começo é a leitura da trilogia pedagógica do professor Ezequiel Theodoro da Silva, com textos bastante acessíveis e práticos. Mãos a obra professores e até o nosso próximo encontro.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Palestra Ensinando leitura e escrita no Ensino Fundamental

Hoje, tive a grata satisfação de participar do encontro Práticas de letramento na Educação Básica, promovido pelas tutoras do BIA de Samambaia e com o total apoio daquela regional. Após a abertura formal, tivemos uma abertura poética com a história Todas as noites do mundo, contada pela Profa. Simone, pessoa conhecidíssima e muito querida de quem faz o curso a Arte de contar histórias, momento lindo ela é fantática. A palestra do dia Ensinando a leitura e escrita no Ensino Fundamental foi proferida pela profa. Drª. Stella Maris Bortoni-Ricardo em companhia da profa. Maria Alice Fernandes. A professora Stella Maris falou sobre os mecanismos para aferir a leitura em nível nacional, estatual e internacional, e os baixos índices alcançados pelo Brasil. Ressaltou a carência de uma formação docente para o ensino da leitura, momento em que nos apresentou o seu mais recente livro que ao meu ver contribui para a sistematização do trabalho com leitura em sala de aula. É uma oportunidade ímpar compartilhar do sólido conhecimento da profa. Stella Maris, é sempre muito enriquecedor encontros com uma profissional desse quilate, sou suspeita para falar, pois os textos e livros da professora são recorrentes em minhas mãos. Parabéns aos organizadores pela escolha tão acertada do tema e palestrante, gostei muito do evento e espero ter oportunidade de participar de muitos outros.
Como já registrei algumas vezes aqui no blog, letramento e leitura são assuntos que me atraem muito e por esse motivo sempre que posso freqüento eventos sobre esses temas. É muito importante e, necessária, a promoção de eventos que possam contribuir de maneira significativa para as práticas do professor, principalmente, quando temos a oportunidade de acessar teorias, refletir e redimensionar as nossas práticas pedagógicas. Leitura e letramento são assuntos freqüentes, não se restringindo à academia, visto ser comum ouvir nos mais distintos lugares a importância de se ler, o que pode se um modismo ( queira Deus o contrário)não é de bom tom dizer que não se lê, ler é chique, dá status. A leitura é muito mais que isso, leitura é conhecimento, possibilidade de interação social, leitura é cidadania. Todos os dias, fazemos a leitura do tempo, dos rostos que passam por nós, de nós mesmos em determinados trajes, dos problemas e alegrias que nos rodeiam, por meio de nosso horizonte de experiências estreito ou ampliado podemos inferir sobre determinados acontecimentos e nesse momento estamos lendo. É uma definição simplista de leitura, mas as coisas iniciam-se de maneira simples, alguém disse que é preciso o primeiro passo para uma longa caminhada e ninguém pode dizer o contrário.

Reflexões acerca da leitura

Compartilho um fragmento do artigo publicado por Gabriel Perissé, na ocasião da divulgação dos resultados do PISA de 2002, passaram-se 6 anos e os resultados da política nacional de educação pró leitura( há??) tem atingido índices bem tímidos, como revelado na última pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. É importante não esquecermos que a leitura deve fazer parte do cotidiano do professor( de todas as disciplinas), pois só podemos oferecer o que temos e é responsabilidade de cada um de nós a formação leitora dos nossos alunos. Passemos ao texto boas reflexões!!

A leitura em último lugar - Gabriel Perissé( Fragmento)
Precisamos pensar, usar mais o ponto de interrogação!
O jovem brasileiro simplesmente lê mal ou será que mal viu seus pais lendo e por isso nunca experimentou o bem que isso faz à nossa visão de mundo?
E se os pais não leram, e portanto não deram o exemplo mais poderoso (o exemplo familiar), não o fizeram por quê? Por falta de livros nas estantes ou por falta de uma consciência da importância insubstituível da leitura?
O jovem brasileiro não lê? Mas não lê o quê? Não lê Machado de Assis e Alcântara Machado? Alguém vai querer nos convencer de que os dois Machados são autores para jovens? E o fenômeno Harry Potter? Será tão difícil perceber que os jovens (e as crianças... e os adultos) gostam de ler boas histórias, e aí não há livro de 500 páginas que assuste?
O ponto realmente problemático não é que a escola brasileira seja incapaz de ensinar a ler. Nem a escola nem os professores são os grandes culpados, embora não devamos diluir sua responsabilidade.
Precisamos criar um ambiente favorável à leitura, com a valorização de quem lê. Os bons leitores precisam de mais espaço e reconhecimento na TV, nos jornais, no próprio sistema de ensino. Precisam sair do último lugar!
Se o Brasil ficou em último lugar nesse "Campeonato da Leitura" é porque a leitura no Brasil está em último lugar.
Precisamos virar o jogo.
Precisamos convocar e ouvir nossos grandes leitores.

Semana de 04 a 08/08

A semana passada foi bem tranqüila, ainda bem. Tive meu primeiro contato ( formal) com as minhas novas colegas de trabalho, encontro na EAPE, encontro com os cursistas e UnB.
No encontro na EAPE soubemos que a equipe está sob nova direção e esperamos que as novas gestoras trilhem caminhos semelhantes aos que foram abertos pelo professor Eri, sucesso para a nova equipe. A dupla Susley & Eliana trouxe-nos o filme Desmundo para que iniciássemos nossas reflexões, eu já havia visto o filme e confesso que ele não me agrada em nada, reconheço a riqueza da produção, as excelentes interpretações, a pesquisa histórica para realização de tal produção, as múltiplas possibilidades de leituras propiciadas pelo filme, mas...não me atrai. O fato é que vi novamente para realizar uma atividade proposta pelo formador e passarei o filme para os cursistas com o mesmo propósito e, espero eu, que nos entusiasmemos e possamos ter sucesso na realização dessa trabalho. Semana que vem eu conto como se desenvolveu a atividade, pois o meu planejamento é desenvolver os fascículos 6 e 7 ao longo de agosto, mesmo porque o fascículo 7 é a parte prática dos fascículos 1, 2 e 3.
No dia 07 recebi a professora Shirley Bragança, GMUT, a aula foi 10, como eu estava auxiliando-a na projeção dos slides, esqueci de registrar em fotos, fiquei...P da vida, muito chateada. Lembrei da propaganda do TRE, kkkk, o meu cometa passou e eu estava passando slides. E por falar em propaganda...a Shirley centrou a sua aula na leitura, de imagens, de propagandas e textos foi muito enriquecedora, pois essa leitura trouxe consigo um reforço para o que já havíamos conversado sobre gêneros textuais, suporte, domínios discursivos e o novo: a interpretação textual ( trabalho com textos em geral) sob a perspectiva dos três olhares e também introduziu o nosso próximo conteúdo: pressuposto e subentendido, acredito que foi muito bom para todos nós, é muito bom saber que na Secretaria de Educação tem muitos profissionais de primeira linha e tão generosos, as professoras Shirley e Sônia, ambas da GMUT, são exemplos de conhecimento e generosidade, disponíveis para ampliar o horizonte de experiências dos colegas. Obrigada Shirley pelo encontro fantástico que você nos proporcionou que, seguramente, ampliou os nossos conhecimentos e demonstrou a aplicabilidade dessas teorias que por muitas vezes questionamos o estudo. O chato é que nem toda essa inspiração me fez produzir uma tira, espero que a professora Patrícia me perdoe e me dê um crédito( até o final do curso publico a tira), pois o memorial que é para o final do curso já está publicado. Nós, professores( alunos), sempre negociando os prazos, vou refletir sobre isso. Boa semana e até breve.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Encontro na UnB 1º/08

Aula com os professores: Patrícia e Dioney, hoje soubemos que a profa. Rita não estará conosco este semestre, tendo sido efetivada como nossa formadora a profa. Patrícia, boas vindas e boas vibrações ao longo do ano. Privilegiar os textos do mundo real, foi uma das propostas lançadas pela professora durante o encontro, pois há uma riqueza de textos que circulam no nosso dia-a-dia( internet, panfletos, out-door) e que podem suscitar as mais variadas discussões no ensino da língua portuguesa.
Após a realização de algumas atividades em sala a professora nos passou umas tarefinhas: A primeira é produzir uma tirinha com algum acontecimento de sala de aula ( grau de dificuldade de 0 a 10 = 10), estou arrepiada, despertar a veia cômica...isso me deixou preocupada, vamos ver o que vai dar, quem sabe não reside aí o meu lado artístico( pouco provável) tenhamos fé. A segunda tarefa é fazer um memorial da minha trajetória escolar e leitora, felizmente eu já havia feito essa viagem e disponibilizo para apreciação e comentários. Essa tarefinha irei reproduzir com os cursistas, mais adiante amadureceremos a idéia.
É isso, até breve e bom fim de semana para todos.

Minha história de leitora



Essa história teve seu ínicio acerca de vinte e seis anos na cidade de Planaltina, DF, local em que vivi toda a minha infância. O local onde morávamos, eu e minha família, era de acesso difícil e com pouca ou nenhuma atividade cultural, com exceção a Via Sacra, um espetáculo que eu via sempre de longe, apenas pelo exército de César que eu esperava passar anciosamente, ano após ano, visto que a minha mãe nunca me deixou subir ao morro para ver a apresentação enquanto moravámos em Planaltina. Em nossa comunidade não havia saneamento básico, era um local sem energia elétrica, entretanto me divertia muito mais do que as crianças dos dias atuais. Talvez pelo fato de que a única tecnologia disponível fosse um rádio a pilhas, a nossa imaginação (irmãs, sobrinhos e amigos) era incrível, nos divertíamos com tudo, nesse período a diversão e a invenção eram as palavras-chave. Seguramente aproveitei muito a minha infância, brinquei de elástico, pique-pega, roda, queimada, bonecas, casinha e uma infinidade de outras inventadas ao bel-prazer. Acredito que essa possibilidade de ser criança me foi muito valiosa, pois eu sempre quis descobrir coisas novas e mantendo esse ritmo, a leitura veio muito antes da alfabetização. Eu "lia" os quadrinhos das revistas da Disney e do Maurício de Souza e contava para os outros o que eu estava lendo, essa experiência se desenvolveu durante muito tempo.
Aos sete anos de idade ingressei na escola formal para alfabetização, estudei até a quarta série na Escola Classe nº. 07 e o ensino fundamental no Centro de Ensino Fundamental nº 01, ambos em Planaltina/DF. Lembro-me com muito carinho da minha primeira professora a "tia" Alvina, que lia muitas histórias e, com muita dedicação e paciência, nos conduzia ao admirável mundo das letras.
De todos os livros que eu li nessa época, além do O pequeno príncipe, nada me foi tão fascinante quanto O Menino Maluquinho do Ziraldo. Acho essa literatura me marcou pelo fato de ter sido o primeiro livro que eu levara para casa a título de empréstimo, saboreei cada página e o li bem mais rápido do que eu imaginara.
O referencial literário na minha família era mínimo, lá em casa não havia livros, exceto Júlias, Sabrinas e livros de Western que minha irmã Sandra devorava rapidamente, dificilmente tínhamos contato com um jornal impresso. Entretanto eu gostava de ler e sempre buscava livros e revistas, alguns amigos da família sabiam do meu gosto pelos livros e volta e meia apareciam com alguma novidade. Já adolescente três livros me marcaram nem sei mais dizer se, pelo conteúdo ou o quê, o fato é que são recorrentes quando me lembro dos livros de que eu mais gostei. O Seminarista, de Bernardo Guimarães e os Pollyanna e Pollyanna moça, de Eleanor H. Porter, é fato que eu nunca mais me atrevi a lê-los novamente, talvez por medo de perder a magia e o encanto que naquela ocasião me foram revelados.
Na adolescência li de tudo um pouco e com muita paixão e intensidade, sobretudo aquelas coleções infanto-juvenis disponíveis nas bibliotecas públicas. Era fã do Marcos Rey, esse escritor me fez viajar em suas histórias por muito mistério e aventura, um combustível vital, tudo o que uma adolescente precisa. Acredito que só tenha lido assim novamente na época em que pleiteava uma vaga no mestrado da UnB, pois igualmente estava me inserindo em um terreno novo até então desconhecido para mim.
A leitura sempre me proporcionou muito: entretenimento, raiva, muita emoção, conhecimento e tantos outros sentimentos, alguns até indizíveis. Quando eu leio me entrego, a leitura é algo absolutamente individual para mim, eu preciso sentir, mergulhar em plenitude naquelas palavras, ou seja, para mim é, num primeiro momento, um prazer completamente individual e egoísta. Passada a leitura, se eu gostar do livro, quero dividir o prazer de lê-lo com todos aqueles que eu quero bem. Quero que todos que eu conheça leiam e sintam e se deliciem como eu me deliciei. Eu tenho essa necessidade de compartilhar esse prazer, em um segundo momento é claro.
O meu percurso como leitora está intimamente ligado a escola, felizmente eu tive o privilégio de contar com grandes mestres ao longo da minha formação e ainda os encontro e, hoje, me emociono muito mais do que antes, com aqueles que mediaram e com aqueles que ainda mediarão a minha formação como leitora.
Somente no período da graduação os clássicos da literatura brasileira começaram a fazer sentido para mim, embora tivesse lido muitos deles ainda na adolescência, o entendimento e o prazer da leitura só aconteceu devido ao papel extremamente significativo de alguns mestres na minha graduação.As aulas de literatura portuguesa, brasileira, poesia, narrativa entre outras, contribuíram sobremaneira para a definição da professora que eu pretendo ser.
Nessa formação acadêmica e, também na minha formação como leitora os mestres: Adriana Levino, Nelson Carvalho (poeta) e Áurea (contadora de histórias), fizeram a diferença, pois a dedicação, conhecimento e, sobretudo o prazer em oferecer o texto era algo encantador, é impossível esquecer desses mestres.
Uma nova vertente na minha vida como leitora ocorreu nas aulas de literatura espanhola e hispanoamericana com a professora Maria Cristina Scalia, ela me ofereceu vários autores e histórias fascinantes e, até então desconhecidas. Por meio de suas aulas conheci Juan Rulfo, Júlio Cortázar, Alejo Carpentier, Calderón de la Barca( La vida es sueño), El cantar de Mio Cid, El Lazarillo de Tormes e tantos outros, foi amor à primeira leitura, não hei de abandoná-los jamás, principalmente os latinos incluindo García Márquez, cuja obra Cem anos de Solidão, eu já li e re-li diversas vezes.

Esse prazer em ler sempre me motiva a querer mais, descobrir coisas novas, e assim no 2º semestre de 2006 cursei a disciplina Literatura de minorias, ministrada pela professora Drª Cíntia Schwantes, nesse momento eu me redescobri conhecendo as letras e tal qual a primeira vez me re-apaixonei. Ali naquela sala onde o universo de experiência das alunas era enorme e variado descobri que não sabia nada e que, embora não soubesse me esforçaria para aprender, a professora falava de algo novo, totalmente novo para mim o Bildungsroman e a possibilidade de se analisar narrativas sob o viés da crítica literária feminista. Posso dizer que a Professora Cíntia é totalmente responsável por mais esse item no meu contexto, visto que o meu objetivo para mais adiante é trabalhar com o Bildungsroman feminino nas obras de Clarice Lispector e Helena Parente Cunha.
Como eu havia dito, a minha experiência como leitora foi construída com as bases fortes da escola, dos professores e das bibliotecas, todo esse conjunto de fatores contribuiu para minha formação inicial de leitora, felizmente já a algum tempo eu posso adquirir livros, revistas e jornais, mas, ainda assim não me esqueço da possibilidade de mediação de um professor.
Agora, tenho trinta e dois anos de idade, já sou mãe e após muitos livros lidos, vejo refletida na face de minha filha um pouco do que eu fui, diferentemente de mim ela têm milhares de possibilidades de diversão, já lê desde os cinco anos, mas como eu, adora ler e, eu como uma mãe coruja que sou, alimento o seu desjo com tudo o que é de bom na literatura infantil e é fascinante vê-la não raras vezes, relendo os livros que já lemos juntas e sempre querendo mais, a última aquisição foi O pequeno Príncipe.
O meu espelho são os meus mestres e quero, assim como eles, fazer a diferença na vida de outros leitores, além, é claro, da minha filha. Acho que timidamente já tenho conseguido resultados positivos e quero conseguir muito mais pois, para mim, a leitura é o alimento da alma.